Mark Marques, jornalista do “Info-Fajãs”, relata o que se vive em São Jorge e teme que os jovens que saíram cortem os laços com a ilha.
Na economia, o Turismo é a primeira vítima.
Desde 19 de março, como descreve a forma como a vida em São Jorge se alterou?
Desde o fim da tarde do passado dia 19 de março, instalou-se a preocupação e ansiedade na comunidade jorgense, sobretudo nos residentes no concelho de Velas, entre a vila das Velas e a freguesia das Manadas. Como em tudo, o desconhecido é temido. A vila das Velas tem estado com pouquíssimas pessoas sobretudo a pernoitar, porque durante o dia todos os serviços públicos estão abertos e encontram-se pessoas a circular na vila e no concelho.
Há saída de pessoas da ilha e também das Velas rumo à Calheta. É um movimento que considera que se manterá ou há, lentamente, um regresso das pessoas às suas casas?
De fato houve um êxodo de pessoas a sair da ilha de São Jorge e dentro da ilha, para o concelho da Calheta. Fizeram-no por iniciativa própria à procura de maior conforto físico e psicológico. Verdade é que a apresentação dos planos de prevenção, fez com que muitas pessoas tomassem a iniciativa de sair do concelho. Os açorianos não tem uma cultura de prevenção, talvez porque os sucessivos governos nestes 40 anos de Autonomia, não incentivaram a esta cultura. Estou em crer que daqui a uma semana ou duas e se esta crise se mantiver neste nível, as pessoas acabarão por voltar às suas casas. Por outro lado, temo que muitos jovens que saíram da ilha, sem terem casa ou outras ligações à ilha, não voltem.
Como avalia a forma como as autoridades regionais e nacionais têm lidado com a situação?
As autoridades locais, regionais e nacionais tem feito um bom trabalho e nota-se que estão bem articulados entre si, no entanto houve algumas hesitações nas mensagens a passar ao público. Por exemplo, afirmar que não deviam vir para a ilha de São Jorge, colocou os jorgenses a pensar: “Então se não devem vir para a ilha, nós devemos sair, porque vem aí algo de muito mau”. Mas a verdade é que todos os dias são prestadas informações atualizadas sobre a situação. Nós queremos saber o que os cientistas e técnicos não nos sabem dizer. Não por omissão, mas porque a ciência ainda não consegue prever os sismos como se prevê a meteorologia.
Quais são os impactos que mais se temem na economia jorgense?
À cabeça o Turismo. Toda esta informação sobre o que se passa na ilha de São Jorge, comparando esta situação a outras, como La Palma nas ilhas Canárias, não abona em nada a promoção da ilha. De lamentar que alguma comunicação social, esteja mais interessada em fazer reportagens com contos da Carochinha e o João Ratão, do que efetivamente informar. Mas mesmo que a crise sísmica acabasse amanhã, a ilha de São Jorge já tem muito para recuperar.
Os mais velhos guardam memórias de crises sísmicas antigas?
Sim guardam essas memórias. Eu sou dos “mais velhos” (60 anos). Vivi intensamente as crises sísmicas de 1980 – ilha Terceira e São Jorge (vivia em Santo Antão/Topo) e a de 1998 – ilha do Faial, já vivendo na vila das Velas. O que não devemos é comparar com os tempos de hoje. Desde logo, o parque habitacional das ilhas e neste caso em apreço da ilha de São Jorge está muito melhor, com casas construídas com todas as regras antissísmicas.
Como está a viver este momento, pessoalmente?
Vou responder como tenho dito às centenas de telefonemas e emails que tenho recebido: “Preocupado, mas calmo”. Ser ilhéu e querer continuar a ser ilhéu tem destas coisas, e é dessa fibra que nós açorianos somos feitos. Como repórter a linha editorial do Info-Fajãs mudou muito nestes últimos dias. Sinto que tenho o dever para com os meus conterrâneos espalhados pelos quatro cantos do mundo, de os informar com notícias da ilha de uma forma verdadeira e rigorosa. Quero deixar uma nota de apreço pelos movimentos criados nas ilhas vizinhas (Pico e Faial), bem como na ilha Terceira, que se disponibilizaram para receber pessoas da ilha de São Jorge. É nestes casos que de facto se põe à prova a solidariedade.
